Aos que me conhecem sabem o quanto considero importante a espiritualidade e a fé. No entanto, tenho me perguntado o que leva milhares de pessoas a abdicarem das suas faculdades intelectuais e se entregarem, cegamente, às religiões oportunistas que exploram o pouco da renda conquistada com muito suor?
A questão, sem pretensões simplistas, nos convida a um mergulho na experiência humana. Carência? Quem sabe. Sabemos como a sociedade anda carente do outro. Na própria família há carência. Pais e filhos  raramente compartilham o calor humano, o contato próximo.

A sociedade moderna cultua entre seus mais “nobres” valores, a exclusão do outro. Perdoem minha ironia, mas, me assusta pensar que nos dias de hoje não conhecemos nem se quer nossos próprios vizinhos, e lamentavelmente, nossos familiares.

Assim, poderia me dar por satisfeito em pensar que essas pessoas estão atrás de carinho, de atenção e são capazes de pagar parte de seu suado salário para dividir algumas horas de contato “caloroso” com outras pessoas.

Sabemos serem esses momentos marcados por um “sentimento oceânico” de fraternidade. Estariam buscando os irmãos perdidos nas relações ditas sociais? No entanto, não me conformo com essa explicação, embora carregada de sentidos. Ignorantes – dirão alguns. Será mesmo? Penso que não. Muitas dessas pessoas trazem histórias de formação intelectual e outras bagagens relevantes e, ainda assim, compactuam com a exploração explícita feita durante os cultos, sempre tomados de um certo espírito de partilha. Alguns deles acompanham, através de noticiários, as fraudes, os desvios de verbas, tomam conhecimento dos destinos vergonhosos de imensas quantias e, ainda assim, estão algemados. São impotentes diante da tirania vigente nos cultos. Parecem-me escravizados e apartados de suas faculdades.

A questão ainda permanece aberta. Qual a origem dessa anulação? Arrisco-me a outra leitura: segundo Freud, pai da psicanálise, carregamos dentro de nós um superego, formado pelos pais, pelas leis. Aos poucos, a criança internaliza  a lei social ou o pacto social vigente. O superego é em nós uma espécie de controle. Cabe a ele a última palavra. É o detentor do gozo. Mas também é tirano e nos oprime, nos adoece. Apesar dessa rigidez, ainda assim, devemos reconhecer seu papel de “controle” na sociedade.
Nas últimas décadas, temos assistido a um declínio do superego. Se temos elementos positivos desse “afrouxamento” por assim dizer, devemos reconhecer os efeitos nocivos para sociedade vistos em diversos aspectos: violência excessiva, falta de limites aos impulsos agressivos, atos de corrupção traduzidos numa fraqueza em fazer valer as virtudes humanas, incontrolável autodestruição representada pelo uso excessivo de drogas. Tudo isso nos deixa na presença da pulsão de morte.

Enfim, penso estarmos diante de um superego “doente”, incapaz de conter os instintos animais presentes no homem. Diria que o homem atual age à revelia de seu superego. Ele domou o superego, mas perdeu as rédeas; perdeu o controle da situação.

Lembro Comênio, no século XVII, preocupado com a formação do sujeito, nos diz algo como: “infeliz instrução a que não se converte em moralidade e piedade! E o que é a sabedoria sem a virtude? (...) a instrução no homem que se aparta das virtudes é como jóia de ouro em focinho de porco “. A sabedoria dos homens de hoje anda apartada das virtudes. O conhecimento é usado para praticar o mal. É assim até mesmo com os pastores que estudam a bíblia para assim seduzir melhor o sujeito e dele tirar proveito.

Penso serem as virtudes monitoradas pelo superego. Ele atua no sentido de sinalizar o caminho devido. Alguns dirão descontentes, ele é tirano, causa dor e culpa ao sujeito, gera sintomas. O que pretendem esses? Devolver-nos a animalidade? Não é para ela que estamos caminhando? A sociedade não nos parece doente de princípios e de valores?
E os templos repletos de pessoas. O que elas buscam? Espiritualidade ou buscam e pagam para terem um “superego” capaz de barrá-los do mal? Não estariam elas em busca daquilo que durante anos e anos proporcionou limites e deu forças para a sociedade lutar contra a natureza selvagem? – o superego.

Às vezes, penso estarem essas pessoas na busca de um “superego”. Identificam-se até mesmo com a tirania presente dos cultos. É uma repetição, é como ser a criança escutando do pai o não, as interdições, isso pode, isso não pode. Fazem um pedido de socorro por uma instância capaz de barrar o sujeito descontrolado, barrar a corrupção, a violência, o animal desenfreado que mora em nós.

Teuler Reis

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